Empresas obtêm alívio fiscal: TIT aplica entendimento do STF sobre ICMS em operações internas.

Uma importante decisão proferida pelo Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo (TIT-SP) reforça a tendência de convergência entre as esferas administrativa e judicial no campo tributário, ao reconhecer a inconstitucionalidade da cobrança de ICMS sobre operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte. A decisão aplica, de forma retroativa, o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 49, o que representa um marco relevante para a segurança jurídica das empresas que realizam operações interestaduais entre suas próprias filiais e matriz.

Entenda o caso

O processo analisado pelo TIT teve origem em uma autuação fiscal lavrada em 2019 contra uma fabricante de eletroeletrônicos, que havia promovido transferências de mercadorias entre sua unidade localizada no Estado de São Paulo e sua matriz situada em Manaus. À época, a empresa recolheu o ICMS à alíquota de 4%, conforme estabelecido pela Resolução nº 13/2012 do Senado Federal, que trata de bens importados.

Contudo, a fiscalização estadual desconsiderou esse entendimento e aplicou alíquotas interestaduais padrão — 7% nas operações com o Estado do Amazonas e 12% nas saídas para Minas Gerais — sob a alegação de que as operações de transferência configurariam fato gerador do ICMS, ainda que realizadas entre estabelecimentos do mesmo titular.

Ao julgar o recurso da empresa, o TIT decidiu, por maioria de votos, afastar a exigência do imposto, entendendo que a operação não deveria ser tributada, em consonância com o novo entendimento consolidado pelo STF. A decisão considerou que, por se tratar de um processo ainda pendente de julgamento administrativo na data da modulação dos efeitos da ADC 49, a empresa teria direito à aplicação retroativa da jurisprudência mais favorável.

A decisão do STF na ADC 49

A ADC 49 foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal em abril de 2021, ocasião em que a Corte entendeu que não incide ICMS sobre a transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, declarando inconstitucional a prática até então adotada por diversos Estados da Federação.

Contudo, o STF modulou os efeitos da decisão, estabelecendo que a vedação à cobrança do imposto passaria a valer apenas a partir de 2024, com o objetivo de dar tempo para que as administrações tributárias e os contribuintes se adaptassem à nova sistemática.

Importante destacar, no entanto, que a própria modulação prevista pelo STF abriu exceção para os processos administrativos e judiciais ainda em andamento até a data do julgamento. Nesse contexto, empresas que já discutiam a matéria poderiam se beneficiar da decisão antes do marco temporal de 2024 — como é o caso julgado agora pelo TIT-SP.

Alinhamento entre esferas administrativa e judicial

Apesar de o Poder Judiciário já ter pacificado o entendimento acerca da não incidência do ICMS em transferências internas, inclusive por meio da Súmula 166 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os tribunais administrativos, como o TIT, vinham adotando postura mais conservadora, aguardando a regulamentação e amadurecimento da jurisprudência.

A recente decisão do TIT-SP marca uma inflexão nessa postura e representa uma sinalização importante de que o contencioso administrativo estadual está se alinhando à jurisprudência dos tribunais superiores, favorecendo a uniformidade na interpretação das normas tributárias e contribuindo para a redução da insegurança jurídica e do volume de litígios fiscais.

O relator do processo no TIT, juiz Carlos Américo Domeneghetti Badia, destacou em seu voto a necessidade de adequação da jurisprudência administrativa ao posicionamento do STF, reconhecendo que manter a exigência do ICMS em tais operações violaria diretamente a decisão da Corte Suprema e comprometeria a isonomia entre os contribuintes.

Impactos para as empresas

A decisão do TIT é especialmente relevante para empresas que operam em mais de um estado e realizam com frequência transferências de bens entre suas unidades. A exclusão da incidência do ICMS nessas operações representa:

  • Redução significativa de carga tributária, especialmente em operações interestaduais com alíquotas elevadas;
  • Maior previsibilidade e segurança jurídica, facilitando o planejamento tributário;
  • Possibilidade de recuperação de valores pagos indevidamente, mediante ação própria ou compensação administrativa;
  • Estímulo à revisão de autuações fiscais pendentes, com base na jurisprudência favorável do STF e agora também do TIT.

Além disso, essa uniformização de entendimento entre o Judiciário e a esfera administrativa evita a multiplicação de processos e fortalece a estabilidade das relações jurídico-tributárias, o que é essencial para um ambiente de negócios saudável e eficiente.

Conclusão

A decisão do TIT-SP de aplicar retroativamente o entendimento do STF sobre a não incidência de ICMS em transferências internas representa um avanço significativo na consolidação de uma jurisprudência administrativa coerente com os princípios constitucionais tributários.

Esse alinhamento contribui para reduzir incertezas, encoraja a resolução de litígios pela via administrativa e demonstra um amadurecimento institucional importante no trato das questões tributárias.

Empresas com operações semelhantes devem avaliar sua situação atual e, se for o caso, buscar assessoria jurídica especializada para revisar autuações passadas, recuperar valores indevidamente pagos e se adequar ao novo cenário com segurança e estratégia.