Uma recente decisão da Vara Única de Porangaba, no interior de São Paulo, reforça um importante princípio do direito tributário e oferece mais segurança jurídica aos compradores de imóveis em leilão judicial: o arrematante não é responsável pelo pagamento de tributos incidentes sobre o imóvel antes da data da arrematação.
O caso concreto
Os autores do processo participaram de uma hasta pública em fevereiro de 2022, ocasião em que arremataram um imóvel. A carta de alienação foi expedida no mesmo dia, e o registro na matrícula ocorreu alguns meses depois, em setembro do mesmo ano.
Ao tentarem quitar os tributos relativos ao período pós-arrematação, os compradores solicitaram à prefeitura a emissão de guia de pagamento proporcional. Contudo, a administração municipal se recusou a emitir o documento conforme solicitado, condicionando a liberação da guia ao pagamento integral de todos os débitos existentes entre 2017 e 2022, ou seja, períodos anteriores à aquisição do bem.
A prefeitura baseou sua exigência no artigo 130 do Código Tributário Nacional (CTN), que prevê a sub-rogação dos créditos tributários relativos a impostos sobre a propriedade imóvel quando há transmissão da titularidade.
O equívoco da cobrança
Apesar da previsão legal da sub-rogação, o município ignorou o que dispõe o parágrafo único do mesmo artigo 130 do CTN, que trata especificamente dos casos de arrematação em hasta pública. O dispositivo é claro ao afirmar que, nesse tipo de aquisição, a sub-rogação dos débitos se dá sobre o preço da arrematação, e não sobre o imóvel em si.
Esse entendimento foi reafirmado pelo juiz Mário Henrique Gebran Schirmer, que analisou o mandado de segurança impetrado pelos compradores. Na decisão, o magistrado declarou a inexigibilidade dos tributos referentes aos exercícios anteriores à arrematação, determinando que a prefeitura não poderia impor ao novo proprietário a obrigação de quitar valores vencidos antes da compra.
Entendimento já consolidado pelo STJ
Além da fundamentação no próprio texto legal, o juiz destacou que esse entendimento já está pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). No julgamento do Tema Repetitivo 1.134, o STJ fixou a seguinte tese:
“Diante do disposto no art. 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação.”
A Corte Superior reafirma, assim, que editais de leilão não podem impor ao comprador a obrigação de quitar débitos anteriores à arrematação, sob pena de afronta à legislação tributária vigente.
Segurança jurídica para o comprador
A decisão representa uma importante vitória para os adquirentes de imóveis em leilão, especialmente em um cenário em que muitos municípios ainda insistem em interpretações restritivas da lei, muitas vezes visando à recuperação de créditos de forma indevida.
É fundamental que compradores estejam bem assessorados juridicamente antes, durante e após um leilão. A análise prévia da situação do imóvel, do edital de leilão e da eventual existência de débitos é essencial para evitar surpresas desagradáveis e garantir que os direitos do arrematante sejam plenamente respeitados.