Uma recente decisão da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) trouxe uma importante reafirmação dos direitos das pessoas com deficiência: o recebimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC) não impede o exercício do direito à isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na aquisição de veículos. O caso analisado pelo TRF-3 envolveu um cidadão com deficiência e baixa renda que buscava a isenção do IPI para comprar um automóvel novo. Seu pedido havia sido negado em primeira instância com base no argumento de que o recebimento do BPC seria incompatível com a concessão de outro benefício, no caso, o fiscal. No entanto, a decisão do tribunal superior corrigiu essa interpretação e reforçou que não há na legislação qualquer vedação à acumulação do BPC com a isenção do IPI.
O BPC é um benefício assistencial previsto na Constituição Federal e regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS – Lei nº 8.742/1993). Ele garante um salário mínimo mensal às pessoas com deficiência ou idosos com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. Já a isenção do IPI está prevista na Lei nº 8.989/1995 e tem como finalidade facilitar o acesso de pessoas com deficiência à mobilidade e inclusão social, permitindo a compra de veículos com desoneração fiscal. Importante destacar que a isenção do IPI não se trata de um benefício de caráter assistencial ou previdenciário, mas sim de um incentivo fiscal. Por isso, os critérios legais para sua concessão são diferentes daqueles aplicados ao BPC e, juridicamente, não há conflito entre eles.
Na fundamentação de seu voto, a desembargadora relatora do caso, Leila Paiva, destacou que o artigo 20, §4º, da LOAS, de fato impõe uma restrição à acumulação do BPC com benefícios previdenciários pagos pelo INSS ou por outros regimes, mas essa limitação não se aplica à isenção fiscal. Segundo a magistrada, a negativa da isenção com base no acúmulo de benefícios é uma interpretação equivocada da legislação e contrária à própria finalidade social das normas envolvidas. Ela também ressaltou que, se houver indícios de que a pessoa beneficiária do BPC deixou de atender aos critérios socioeconômicos exigidos para sua concessão, cabe à autoridade competente revisar o benefício assistencial, e não negar o direito à isenção do IPI.
Essa decisão representa um avanço importante na garantia dos direitos das pessoas com deficiência, especialmente daquelas em situação de vulnerabilidade social. O acesso ao transporte individual é, para muitos, uma condição essencial para exercer atividades básicas do dia a dia, como trabalhar, estudar, realizar tratamentos médicos e participar da vida em sociedade. Negar esse acesso com base em uma leitura excessivamente restritiva da lei compromete o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, e fere os objetivos fundamentais da República, como a promoção do bem de todos e a redução das desigualdades.
É fundamental que as pessoas com deficiência e seus familiares estejam bem informados sobre os seus direitos, pois muitas vezes eles são negados de forma automática por interpretações inadequadas ou por falta de orientação técnica. O acompanhamento jurídico adequado é essencial não apenas para garantir a efetivação de benefícios como esse, mas também para evitar prejuízos e constrangimentos injustos.