Norma que permite indisponibilidade de bens pela Fazenda Pública por meio de Certidão de Dívida Ativa é inconstitucional

O procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestou-se pela inconstitucionalidade de dispositivos legais que estabelecem a indisponibilidade de bens do contribuinte devedor por meio da averbação da Certidão de Dívida Ativa (CDA) nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora. O tema entrou em debate na sessão desta quinta-feira (3), do Supremo Tribunal Federal (STF), realizada por meio de videoconferência, em julgamento conjunto de seis ações diretas de inconstitucionalidade contra o artigo 25 da Lei 13.606/2018, na parte que altera a Lei 10.522/2002.

Em sustentação oral, o procurador-geral da República destacou que a Constituição brasileira consagra a limitação do Poder, proclama um catálogo de direitos e garantias, assegura o acesso à jurisdição como cláusula pétrea, impõe limites ao Poder de tributar e condiciona a satisfação do crédito tributário a parâmetros jurídicos inafastáveis. Nesse sentido, apontou inconstitucionalidade formal e material dos dispositivos legais questionados.

Aras explicou que o legislador estabeleceu a possibilidade de a Fazenda Nacional tornar indisponíveis bens do contribuinte devedor por meio da averbação da CDA nos órgãos de registro de bens e direitos sujeitos a arresto ou penhora. Com isso, ficam indisponíveis, como se estivessem sendo objeto de medida judicial de constrição. Segundo o PGR, isso “é incompatível com o sistema constitucional brasileiro”.

De acordo com Aras, a cláusula do devido processo legal com natureza substancial protege a propriedade. “A indisponibilidade com um óbice à disponibilidade atenta contra o direito de propriedade sem observância da cláusula do devido processo legal substancial e também formal”, argumentou. Dessa forma, apontou inconstitucionalidade formal, por violação da reserva de lei complementar, estabelecida no artigo 146, inciso III, alínea b, da Constituição.

O procurador-geral explicou que a averbação da CDA que torna indisponível o patrimônio do devedor traduz um mecanismo que visa a garantir a satisfação do crédito tributário. “Não se trata, tão somente, de dispor sobre procedimento de cobrança administrativa de tributos, mas de instituir garantia da satisfação do crédito tributário”, observou. Para Aras, essa cláusula restringe o direito de propriedade, protegido pela Constituição.

Inconstitucionalidade material – Augusto Aras também defendeu a inconstitucionalidade material da norma pelo fato de a indisponibilidade de bens do devedor, por medida administrativa de averbação da CDA, violar a reserva de jurisdição. “Providências dessa natureza, por atingirem o patrimônio do contribuinte, demandam decisão emanada de órgão judicante”, sustentou.

De acordo com o PGR, os dispositivos em análise também violam o devido processo legal e a proporcionalidade, “dada a maneira desmedida pela qual o direito de propriedade e o livre exercício da atividade profissional e empresarial são atingidos”. Para o procurador-geral, é uma forma indireta de cobrança do crédito tributário. “Cuida-se de mecanismo coercitivo empregado pela Fazenda Pública para induzir o devedor ao cumprimento da obrigação tributária, sem a necessidade de que se promova a execução fiscal”, frisou. Aras assinalou que existe forma própria, instituída por lei, para que a Fazenda Pública assegure a quitação da dívida. Segundo ele, o processo de execução fiscal é juridicamente adequado.

Sobre a violação ao devido processo legal substancial, Augusto Aras destacou que essa cláusula é a fonte de onde emana o dever de proporcionalidade dos atos do Poder Público. Para ele, a constrição de bens pela via administrativa afigura-se desproporcional. “O meio instituído pelo legislador, assim, é excessivo, desnecessário, além de irrazoável”, opinou.

Fonte: MPF