Por Dr. Fábio Antignani
O ordenamento jurídico brasileiro, em sua função precípua de regular as relações sociais, abrange não apenas os eventos da vida civil, comercial e patrimonial, mas também os aspectos que envolvem o fim da existência humana. Nesse contexto, destaca-se o Direito Funerário, ramo ainda pouco explorado, mas de inegável relevância, cuja finalidade é assegurar a observância da legislação aplicável às situações que se apresentam após o falecimento de uma pessoa.
O Direito Funerário compreende um complexo conjunto de normas e princípios jurídicos que regulam as relações e situações que surgem após a morte de uma pessoa, abrangendo desde a organização e funcionamento dos cemitérios até a execução de testamentos, a gratuidade de serviços funerários para populações vulneráveis, a tributação sobre jazigos e terrenos funerários e os direitos dos familiares no luto.
Na Costódio Sociedade de Advogados, entendemos que lidar com questões legais em um momento de perda exige sensibilidade, experiência e profundo conhecimento técnico. Por isso, oferecemos uma atuação sólida, responsável e acolhedora nas diversas frentes do direito funerário. A seguir, apresentamos algumas das principais situações jurídicas abrangidas por esse ramo do Direito:
1. Testamento e manifestações de vontade post mortem
O testamento é o instrumento jurídico por meio do qual uma pessoa, em vida, determina a destinação de seus bens, faz nomeações e, em muitos casos, expressa sua vontade sobre o próprio funeral: se deseja ser sepultada ou cremada, se deseja doar órgãos, onde pretende ser sepultada, entre outras disposições de última vontade.
Essas manifestações são juridicamente válidas e devem ser respeitadas, desde que observadas as formalidades legais. No entanto, quando não há clareza no documento ou quando a família discorda da execução dessas vontades, surgem litígios que exigem atuação jurídica especializada.
2. Gratuidade e subsídios nos serviços funerários
O falecimento de uma pessoa em condição de vulnerabilidade social pode gerar uma série de dificuldades para a família, inclusive financeiras. Em razão disso, muitas prefeituras oferecem auxílio-funeral, que pode abranger desde o fornecimento de urna funerária até os custos com o sepultamento.
Esse direito, garantido por legislações municipais e pela política pública de assistência social, nem sempre é concedido de forma automática. Quando há negativa injustificada por parte do poder público, a via judicial pode ser necessária para garantir o acesso digno aos serviços funerários.
3. Cemitérios públicos e privados: regras e responsabilidades
Os cemitérios no Brasil podem ser públicos, privados ou religiosos, e cada modalidade está sujeita a regras jurídicas específicas.
• Cemitérios públicos são geridos pelos municípios e têm a obrigação de garantir o sepultamento gratuito ou acessível à população, respeitando critérios de igualdade e dignidade.
• Cemitérios privados, por sua vez, funcionam mediante concessão do poder público e são regulados por normas que fixam padrões de qualidade, manutenção e prestação de serviços.
Além disso, existem discussões recorrentes sobre a vinculação religiosa em cemitérios públicos e a necessidade de garantir liberdade de culto nos rituais funerários, conforme estabelece a Constituição Federal.
4. Direito perpétuo de uso e os limites da posse do jazigo
O chamado direito perpétuo de uso de jazigo não é equivalente à propriedade privada do espaço físico no cemitério. Trata-se de um direito de uso por tempo indeterminado, adquirido junto ao município ou à administradora do cemitério, e que pode ser transmitido aos herdeiros.
Contudo, esse direito pode ser perdido por abandono, falta de pagamento de taxas de manutenção, ou por falta de uso comprovado por longos períodos. Em muitos casos, familiares descobrem tardiamente que o jazigo foi reutilizado ou transferido, o que gera litígios administrativos e judiciais que demandam conhecimento especializado na área.
5. Manutenção de cemitérios e a questão do IPTU
A responsabilidade pela manutenção dos cemitérios varia conforme o tipo de administração. Em cemitérios públicos, essa função é do município; em cemitérios privados, cabe à concessionária garantir limpeza, segurança e infraestrutura.
Uma discussão relevante é a incidência de IPTU sobre os cemitérios, especialmente em relação aos administrados por entidades religiosas, assistenciais ou beneficentes. O Supremo Tribunal Federal já reconheceu, em diversas decisões, a imunidade tributária dessas entidades, desde que comprovado o cumprimento de sua função social e religiosa, sem fins lucrativos.
6. Direito funerário no STF: precedentes relevantes
O Supremo Tribunal Federal tem julgado temas cada vez mais complexos relacionados ao direito funerário. Entre os precedentes mais significativos, destacam-se:
• A garantia da liberdade religiosa em rituais funerários, impedindo o Estado de restringir práticas tradicionais de determinados grupos, como indígenas e religiões de matriz africana;
• O reconhecimento do direito à memória, à verdade e à dignidade de vítimas de regimes autoritários enterradas em valas comuns, como no caso de cemitérios clandestinos de presos políticos;
• A discussão sobre a destinação legal e ambientalmente segura de restos mortais e cinzas, evitando danos ambientais e conflitos familiares.
Esses precedentes moldam o entendimento sobre os limites entre o interesse público, a liberdade individual e os direitos dos familiares no contexto pós-morte.
7. O papel do advogado no direito funerário
As questões funerárias, por mais delicadas que sejam, frequentemente exigem intervenção jurídica qualificada. A atuação do advogado é fundamental para:
• Garantir o cumprimento de testamentos;
• Defender o direito de uso de jazigos;
• Exigir a prestação adequada de serviços funerários;
• Representar famílias em ações contra abusos ou negligência do poder público ou de concessionárias;
• Buscar isenções fiscais e auxílio-funeral;
• Orientar administradoras de cemitérios sobre obrigações legais, contratos e licenças.